Norwegian Wood - Haruki Murakami (Ed. Alfaguara)


Presente do meu pai em meu aniversário de 22 anos, e escolhido por mim na livraria Cultura de Fortaleza “Norwegian Wood” foi talvez o melhor livro que já li até hoje. Talvez por ser praticamente impossível não se identificar com o protagonista, o jovem universitário Toru Watanabe. Ou porque Haruki Murakami escreve com uma sensibilidade que atinge em cheio o coração, e que deixa qualquer leitor desarmado. É um romance que fala de solidão, principalmente. Uma solidão incancelável e pessoal, compreensível apenas aos nossos olhos. Acredito que um livro que consegue esse feito é capaz de mudar algo em nossa vida.

O romance se desenvolve em flash backs e captura a juventude de Toru, dos 18 anos 20 anos, quando morava em um alojamento estudantil nos primeiros anos na faculdade de Teatro. Na época, envolto em uma rotina tediosa de estudo e no emprego noturno em uma loja de discos Toru resignava-se de uma existência sem grandes acontecimentos. Até o dia em que cruza com Naoko, namorada de seu amigo morto Kizuki, que havia se suicidado anos antes. O reencontro representa um divisor de águas, para ambos. Na sombra daquela tragédia tão devastadora que marcara o final da adolescência, os dois iniciam uma espécie de relação. Primeiro uma amizade silenciosa, baseada na compreensão de que o único elo que os havia unido não estava mais vivo e depois um amor romântico, permeado também de culpa e quase esmagado pelo fantasma que ainda pairava sobre a memória deles.

Surge em seguida Midori, colega de Toru nas aulas de História da Arte. Midori é uma profusão de sentimentos e adjetivos hipnóticos, a própria vida representada na forma de uma jovem mulher, o oposto recorrente e perfeito de Naoko, uma figura que apesar de bela e generosa exala morbidez e tristeza. Assim que a relação de Midori com Toru avança, fica patente que é ela a garota perfeita para ele. Mas é certo que o coração geralmente escolhe os rumos mais difíceis e inusitados. Apaixonado por Naoko, o protagonista descera pouco a pouco ao abismo de desespero que é o mundo dela, compartilhando momentos difíceis e outros luminosos, como a visita que faz a casa de repousos onde a moça tenta se recuperar de uma profunda depressão. Essa viagem de Toru ao interior do país é ilustrativa da encruzilhada amorosa em que se encontra. Midori é a capital Tóquio, fervilhante e cheia de oportunidades e opções, já Naoko é o país recolhido em si, taciturno e selvagem, entranhado nas montanhas e florestas e quase sempre silencioso.

Em resumo, “Norwegian Wood” trata disso; dos rumos do coração. Mas não se trata, porém, de uma abordagem tão simplória. É bem mais que isso. É uma tapeçaria de citações da geração jovem no Japão da década de 60, uma geração marcada pelas transformações que a época ensejava, e que andava de mãos dadas com a cultura ocidental. É saboroso ver o protagonista mencionar tal escritor ou musica, e mais delicioso ainda as descrições dos lugares por onde passava. É o recorte de uma época cristalizada por emoções intensas, aquelas que marcariam uma vida, ou várias, como ocorre aqui. Cada personagem vem com uma identidade própria e repleta de incertezas ou pior, de certezas opressivas e egoístas, como é o caso de Nagasawa, o amigo muito inteligente e insuportavelmente mesquinho de Toru. Mas todos, sem exceção, carregam nas costas uma história passada e ainda um futuro. É uma característica quase superlativa na escrita de Murakami. Os diálogos entre esses personagens é tão bem escrito, tão profusamente disparados e em sua maioria carregados de emoção que se tornam universalmente compreensíveis, como se a trama não precisasse de lugar e tempo.

Desde então não consigo parar de ouvir Norwegian Wood, dos Beatles, a musica que dá titulo ao livro e que é a canção favorita da personagem Naoko (também não consigo parar de ouvir Bird of Paradise do Snowy White, mas é porque sou romântico mesmo). Por sinal, romantismo é o que não falta a “Norwegian Wood”. Toru é um sujeito tão jovem e ordinário – no sentindo literal do termo – e tão empático e profundo que me apaixonei por ele já nas primeiras paginas. Paixão mesmo. Não tenho vergonha de admitir. E a coisa piora. Murakami, não satisfeito em criar um protagonista tão envolvente e parecido com todos nós, também entrega uma Midori da vida. Que garota. Eloqüente, extrovertida, liberada e liberal, explosiva de sentimentos e criativa a seu modo. Enfim, uma personagem marcante, de um romance inesquecível.

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