Mestre em tensões em um nível
pessoal, Suzanne Collins inicia e desenvolve o segundo volume dos “Jogos
Vorazes” em uma velocidade alucinante e enche de perplexidade o leitor com o
desenrolar dos acontecimentos. Soma-se a isto a confusão psicológica da
protagonista, que narra a história através de sua lente de caçadora acuada e
temos outro livro juvenil memorável. “Em Chamas” descreve os eventos que se
sucederam ao primeiro volume, e narra a maneira desenfreada com que a vida toma
proporções gigantes, descontroladas e imprevisíveis a partir de certa idade.
Novamente temos na superfície uma trama de ação, em que os sobreviventes de
cada massacre ao longo de todos os anos em que a competição foi instaurada são
obrigados a se inscrever em um novo sorteio, para uma batalha especial.
A arena em que são lançados soou
para mim como outra referencia á vida moderna. Vale somente dizer que ela tem
haver com a rapidez com que, no exato instante em que o tempo nos entrega algo
também nos atinge com sua dádiva. Flexionado, esticado, diminuído ou intenso em
sua forma, o tempo também é calculo e precisão, mas nos faz crer que estamos
sempre lutando contra a corrente e sendo enganados por ele. Katniss é
apaixonante nesse sentido, quando desde cedo é treinada para desconfiar do
tempo e de tudo mais a volta, mas nem por isso deixando de ser fisgada pelos
sentimentos de sua idade. Temos aqui personagens incríveis por si só, e que
individualmente, dariam um outro numero de romances estupendos. Finnick Odair,
por exemplo, como o exuberante e letal competidor do distrito 4, que guarda
dentro de si bem mais do que sua aparência demonstra, ou mesmo Johanna Mason,
frívola e indiferente, mas que não demora a se mostrar disposta e cativante.
Daí surge o filho da navalha de
“Em Chamas” e que guia toda a trilogia: o de se irmanar com pessoas
visivelmente absorventes e fascinantes, mas continuar a crer que elas
representam nosso possível declínio. Confiar e legar á terceiros nossa
segurança e bem estar, mas temer ser traído nesse pacto de vida. Em um jogo em
que perder significa morrer, Katniss partilha dessa desconfiança, mas entrega a
esses personagens, cada um crível à sua maneira, algo precioso que é sua
boa-fé. Algo que hoje em dia fazemos com igual relutância, dada a maneira com
que o tempo e as circunstancias costumam puxar o tapete sob nossos pés.
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