Há quantidade suficiente de originalidade e talento na produção de
“Regras da Vida” que poderia tê-lo feito inesquecível. Mas há algo de muito
lapidado na direção de Lasse Halström (de Chocolate)
que impede que as emoções venham à superfície no coração do expectador. O
roteiro tem a assinatura de John Irving, que ganhou o Oscar ao adaptar o
próprio livro para as telas. John Irving já havia sido adaptado antes para os
cinemas com “O Mundo Segundo Garp”,
um dos melhores filmes que já assisti e uma pérola desconhecida da década de
80, e a diferença entre os dois filmes é abismal. É possível perceber a
linguagem multifacetada e a narração descritivamente fantástica. John Irving
tem essa capacidade única de transformar o cotidiano mais trivial em um
universo envolto em lirismo. Mas “Regras da Vida” perde muitas oportunidades de
utilizar bem esse lirismo e essa franqueza. Não deixa de ser belo, no entanto.
Mas lhe falta um coração pulsante, algo que leve a quem assiste à emoção
intuitiva.
Michael Caine interpreta Larch, o médico de um orfanato no Maine que
cuida de órfãos enjeitados por mães muito jovens ou problemáticas. O lugar é
abarrotado de crianças que vieram de relações precoces ou de lares desfeitos e
é um lugar para onde jovens grávidas vão buscar socorro, pois Larch é
especialista na realização de abortos. Uma dessas crianças é um menino chamado
Homer Wells adotado ainda bebê, mas devolvido logo em seguida. Os pais adotivos
o consideravam estranho, pelo simples fato de a criança ser muito feliz para
chorar, concluindo o casal que ele devia ter algum problema com o qual eles não
estavam dispostos a lidar. A segunda família que adota o bebê Homer já é mais
“prática” na solução do que consideram um problema: se o menino não chora
naturalmente eles o fazem chorar batendo nele, ao que o médico Larch o leva de
volta ao orfanato.
Homer assim cresce sob a tutela do Dr.Larch, aprendendo todas as
praticas que envolvem o cuidado com pacientes desesperadas que ali chegam ou
com os órfãos que são deixados para trás. Desde o nascimento essas crianças são
tratadas de uma maneira toda especial por Larch e o par de enfermeiras
interpretadas pelas soberbas Kathy Baker (Edward
Mãos de Tesoura) e Jane Alexander (Kramer
VS Kramer). Larch tem um carinho maior por Homer, pois é uma das únicas
crianças que chegaram à vida adulta vivendo naquele lugar que emana carinho e
atenção, mas que jamais preenche o papel de uma família. Nada explica melhor
esse sentimento prolongado de desamparo do que a cena em que o orfanato recebe
casais a procura de um filho adotivo: as crianças estão sentadas a mesa
almoçando e cada uma delas tenta demonstrar porque merece ser adotada. É
singela essa demonstração de bravura e Larch é o personagem chave dessa
construção de caráter, todas as noites lendo um clássico da literatura para os
órfãos e se despedindo deles chamando-os de “Príncipes do Maine e Reis da Nova
Inglaterra”.
Se essas crianças não são importantes para o mundo, são essenciais para
o orfanato e cada uma é preciosa para aquela família acidental. Conforme vão
crescendo e deixam de representar um interesse para possíveis pais adotivos,
esses meninos e meninas passam a representar o futuro do orfanato e a eles é
mostrada a realidade dos fatos e a delicadeza da vida. Quando uma jovem chega
ali gravemente ferida, após realizar um aborto malfeito por um médico
clandestino, Larch explica a Homer que sua pratica não é apenas fruto de um
ponto de vista, na verdade nem chegando a sê-lo. É algo que surge da
necessidade de se preservar a vida de alguém muito jovem e despreparada, de
mulheres a beira do desespero e que recorrem á medidas drásticas. Homer inicia
um processo de transformação psicológica, que o levará do orfanato até uma
cidade litorânea na companhia de Wally (Paul Rudd) e Candy (Charlize Theron),
um casal que recorreu ao orfanato para interromper a gravidez da moça.
Homer começará a trabalhar na colheita de maças na propriedade que
pertence à família de Wally e quando este parte para a guerra a aproximação
entre ele e Candy se torna inevitável. O titulo original do filme faz
referencia ao quadro de regras pregado na parede do dormitório onde Homer dorme
com os outros funcionários que trabalham na colheita, todos eles negros e donos
de uma crença própria e pessoal, e com a qual o protagonista terá de lidar em
certo momento da trama. A temática de “Regras da Vida” é muito bem definida
perto de seu desfecho, quando cada personagem assume seu verdadeiro lugar na
realidade em que vive, nem sempre sendo essa condição uma expressão de livre
arbítrio. No caso de Candy vêm mais do sentimento de culpa e débito para com o
namorado do que a vontade de cuidar dele, que volta da guerra paraplégico. Já
Homer se posiciona diante dos fatos com maestria, ainda que perplexo com os
rumos de tudo, mas nunca deixando transparecer insatisfação. Muito dessa
serenidade vêm da interpretação de Tobey Maguire, que nada lembra o atrapalhado
Peter Parker da trilogia “Homem Aranha”.
“Regras da Vida” possui imprecisões incômodas, como o trato que seu
diretor dá aos temas polêmicos presentes, sendo o aborto o mais obvio. Lasse
Halström se abstêm de dar seu ponto de vista e o máximo que Larch, o médico que
rendeu o segundo Oscar de coadjuvante para Michael Caine diz é que não
recomenda a pratica do aborto, apesar de exercê-la e defende-la. Nem a relação
incestuosa entre o pai e uma filha recebe a atenção devida, sendo coberta de
panos quentes e emanando compreensão na conclusão trágica de seu
desenvolvimento. Poderia ser mais incisiva essa abordagem, o que resultaria sem
duvida em um filme incrivelmente mais sincero.
Estou a quase 1 hora procurando esse filme para download legendado e não encontro. Só encontro dublado...
ResponderExcluirGostaria de ser parceiro do seu blog, eu adicionaria o sr na seção "Atualizações dos blogs parceiros" e o sr adicionaria o meu na sua seção "blogs preferidos", meu blog é o ozymandiasrealista.blogspot.com.br.
Aguardo retorno,
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