A HISTÓRIA SEM FIM (NEVERENDING STORY – WOLFGANG PETERSON/1984)



Era meia-noite na Floresta Uivante. O vento sibilava sobre a copa das arvores seculares. Subitamente algo enorme colidiu, e ressoou através da floresta misteriosa.

Um filme inesquecível para aqueles que o assistiram inúmeras vezes desde seu lançamento e nas constantes exibições durante as tardes. É um trabalho autoexplicativo e monumental do alemão Wolfgang Peterson, mas nem por causa de sua simplicidade narrativa deixa de ser inventivo na condução de sua trama, baseada no romance homônimo de Michael Ende. A produção contou com uma equipe basicamente europeia e um bom elenco de atores desconhecidos. A direção de arte é um capitulo único, pois concebe um mundo fantasticamente realístico, e igualmente assombroso em seus detalhes. É uma história fantasiosa, mas que não deixa de passar verossimilhança na abordagem de seus personagens, todos impelidos pela curiosidade em descobrir uma fronteira nova.

A História sem Fim” possui dois protagonistas. O primeiro deles é Bastian (o fofo Barret Oliver), um garoto retraído, mas inteligente, dono de uma imaginação hiperativa e totalmente diferente dos garotos de sua idade. Quando o filme inicia Bastian está acordando de um sonho que teve com a mãe, morta recentemente, e quando senta a mesa do café da manhã e conta ao pai o acontecido este pede delicadamente, mas com ar de seriedade, que o filho deixe o passado para trás, e mais ainda o mundo dos sonhos e da imaginação, ao qual o menino visita frequentemente na forma de leituras dos clássicos da literatura como “Robinson Crusoé” e “As Vinte mil Léguas Submarinas”. É compreensível o cuidado do pai, já que a necessidade de sobrevivência, do trabalho e das contas a pagar o deixa sem tempo para aprofundar a relação com o filho, ainda mais agora que ele tem de desempenhar o papel que também era da mãe. Logo, se tornará um trabalho a menos se Bastian amadurecer mais rapidamente, e aprender a se proteger dos perigos cotidianos como a violência juvenil e as drogas, e aprender responsabilidades que futuramente possam lhe garantir uma vida sem a dependência do pai.

Assim que Bastian sai para o colégio, seus colegas brutamontes o perseguem pelo bairro e o jogam em uma lata de lixo, algo que se repete quase que diariamente. No dia em questão o menino se refugia em uma livraria antiga, chamada Koreanders, onde um senhor de óculos e cachimbo na mão o informa que está no lugar errado, já que o fliperama fica no fim da rua. Bastian retruca que conhece os livros, e que os têm aos montes em sua casa. O homem logo se interessa e percebe imediatamente que o menino é especial. Os dois iniciam uma conversa envolvendo o livro que o velho está lendo, e que ele garante ser uma obra diferente das demais, perigosa inclusive. Parece obvio que ele diz isso para aguçar os sentidos de Bastian e o menino sai da livraria com o volume sob o moletom, enquanto o livreiro se vira para atender ao telefone.

Na escola, Bastian foge da aula de matemática, e se esconde no sótão, um lugar calmo, repleto de objetos antigos e de teia de aranha e ali inicia a leitura do livro surrupiado. É apresentada Fantasia, uma terra sem limites entre o possível e o imaginável, repleto de esplendor e onde criaturas dividem o espaço com a grandiosidade da natureza. Uma natureza avassaladora e unida pela figura virginal da Imperatriz Menina, a soberana deste reino, que encontra-se doente, devido á um mal que parece implodir os alicerces de Fantasia e que ameaça engolir para o vazio cada ser vivo. A Torre de Marfim, coração orgânico de Fantasia, recebe a visita desesperada dos diversos seres cujas terras estão sendo devastadas e que foram ali em busca de uma explicação e uma solução para o problema. É chamada a única pessoa que pode impedir que isso ocorra: Atreyu (Noah Hathaway), guerreiro do povo das planícies, uma raça de homens que vivem de caçar um ser mítico conhecido como o Búfalo Púrpura. Quando Atreyu responde a convocação e chega ao terraço da Torre de Marfim todos exclamam em uníssono: o guerreiro não passa de um garoto. Mas a urgência da situação deixa da descrença de todos de lado. Atreyu agarra a missão, deixando suas armas para trás e partindo em busca da cura para a doença da Imperatriz, tendo apenas seu amado cavalo Artax como companhia.

Toda a trama será retratada na corrida de Atreyu contra o tempo em contagem regressiva e na ansiedade crescente de Bastian em desvendar o final dessa historia maravilhosa. Eles se reconhecerão em um ponto da trama em que o valor da imaginação é posto em xeque, e na qual é vital que realidade e sonho andem de mãos dadas na mente do homem. Do contrario haverá a morte da criação e das coisas belas que elas trazem, da literatura, da musica, da arte. A imaginação é a principal ferramenta do homem para a evolução de uma civilização e nenhuma metáfora é mais bela que a cena em que Artax e Atreyu atravessam um pântano. Atolados no lodo e na lama, ambos têm de persistirem com coragem e disposição, do contrario serão dominados pela tristeza e afundaram. Artax desiste, Atreyu permanece, ainda que arrasado.

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